quinta-feira, 5 de julho de 2007

O Bardo Sofredor e o Senhor Desencanto...




O Bardo Sofredor e o Senhor Desencanto
No Bosque das Ilusões Perdidas


-> Trilha sonora


O Relógio bate duas horas
Da madrugada
No Secret Garden
Da Esperança me despeço
Pago a conta
Troco os passos
Em companhia do Senhor Desencanto

Margeando a lagoa caminhamos
Nas amendoeiras, corujas cantam
Plácida a lua navega
No firmamento
Clareia nossa senda
Em tons prateados
Rumo ao Bosque das Ilusões Perdidas

Das luzes da cidade
Afastamo-nos
Envoltos num ar de mistério
Trilhamos estrada de terra
Sinuosa, sombreada ao luar
Pelas copas das árvores frondosas
Um riacho pedregoso murmura sereno seu canto
A voz da noite diz tanto...
Folhas dos matos farfalhando ao vento
Pássaros noturnos
Pirilampos luzindo
Estrelas cadentes riscam o céu
Ruídos de passos
No chão de terra batida
Sons de respiração

Aguçando os ouvidos
Mesmo o som do coração
Em seu trabalho incansável enquanto há vida
Escuto no silêncio madrigal

Cruzamos longa alameda de Ipês-Roxos
Abundantemente floridos
Iluminados à lua cheia
Chegamos ao Bosque
Onde vive o Senhor Desencanto


- O Senhor Desencanto –


- Vedes Bardo sofredor
Aqui é meu refúgio
Nele vivo, ainda se mourro
Uma vida a cada dia
Nem mesmo a Senhora Solidão
Habita nesse ermo bosque
Animais silvestres, o verde
O regato, a lua, as estrelas
Companheiros únicos
Respeitosamente mudos
Testemunham
A dor do meu infortúnio

No silêncio em que se quedam
Aprendo as lições
Da vida sem queixar-se
Palavras de dores a outrem ditas
Lastimando
Aprofundam o abismo
Laceram alma e carne
Não cicatrizam a ferida

Nesse ermo bosque
Sepulto a vida morta
Em pranto seco de amores
Pela Senhora Encanto

Jazem lágrimas e lástimas
Ó, caro Bardo sofredor
Na mesma cova funda
Do meu peito
A ninguém me queixo
Andarilho nos vales malditos
Povoados de corvos, abutres, víboras
Morcegos e ratos
Tornei-me mestre
Nas mãos do Cuteleiro Impiedoso
Em suportar a ira do fogo

O Ferreiro amolda minh`alma
Na fúria de seu martelo sob a bigorna
E calor das chamas
Reveste meu corpo de armadura
Polindo-a nas tribulações

Não tornei-me um Titã
Ó, companheiro de infortúnio
As dores padeço
Sentindo cada uma delas lancinante
No entanto suporto sem alarde
Quedando-me emudecido em ermo bosque
Sobrevivo à severa morte
Dos sonhos que um dia acalentei
Seguindo sem queixar-me
Meu caminho tristonho



- O Bardo Sofredor –


- Ó, Senhor Desencanto!
Compreendo vosso padecimento
Emudecido na dor abrandada
Mas cada dor tem sua diferença
Seus tons pincelados
Em cores próprias
Aqueles que encobrem o quadro de minh`alma
São cinza bem escurecidos e negros
Da videira malquista
O vinho que bebo é amargo
Fel azedo em cântaro de ocre
Vinagre e sabor de ferrugem
Clamando o beijo da morte
No breu silenciando os murmúrios
Visceralmente enraízados
Num morto-vivo desafortunado

Tão grande Amor um dia senti
Naquela voz de veludo
Na noite contando causos
Generosa em risos
Doce e profunda
Menina e mulher
Imperativa na realeza majestosa
Atenciosa em cumprir caprichos
Não e sim
Claridade desnuda e mistério
Luz e bruma
Fortuita e gratuito presente
Paixão e fuga
Enlevo dos sentidos e prendas
Na perfeição santificada
Ainda que tão puramente
Mulher que sente
Amor e desejo

Empreendi tão longa jornada
Em tortuosas trilhas
Cruzando desertos e vales sombrios
Atravessei os mares
Subi os píncaros dos montes
Contemplando a imagem mais bela
Na humana forma
De ninfa graciosa
Olhos cor de mares
Madeixas cor de noite
Sob espáduas nuas alvas

Deslumbramento dum Bardo inebriado
Diante a Musa Majestosa
Em miragem
O espelho da Perfeição
Promessas de amores
E Noites com Sol
Refulgindo Paixão

No alto do píncaro mais alto
De todas as montanhas do mundo
Minha vida reencontrada
Em infindas existências de busca
Num feitiço de Áquila
Abre asas e bate vôo
Em direção contrária
Atada a antigos laços
Nós intrincados feitos
Pelas mãos malevolentes de Merlin
Em pergaminhos amarelados
Desmanchando em pedaços

Laços e nós emaranhados
Que nem mesmo o Amor Soberbo
Foi capaz de rompê-los
Ainda não sabendo a ninfa
Se algum dia
Nessa ou noutra vida
Haverá outro Amor
Maior
Mais forte
Belo
E Verdadeiro






O Bardo Sofredor abandona o Senhor Desencanto no Bosque das Ilusões Perdidas e segue seu caminho solitário, rumo à cidade deserta num madrigal derradeiro.




Rob Azevedo





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