sexta-feira, 29 de junho de 2007

Um Dia Naturalmente...




Um Dia Naturalmente...


-> Trilha sonora


Crescido
Vejo minha barba no espelho
E cabelo já um pouco ralo
Alguns fios grisalhos
Deixam-me espantado
O semblante cansado
Retinas desacreditadas
Que o mundo possa ser diferente
Na garagem
Meu carro não é de brinquedo
Nos porta-retratos
Algumas fotos
São maiores de idade
E eu já era homem grande
Os sorrisos que as lentes registraram em meu rosto
Naquele tempo vinham espontâneos
Sem preocupações
Economia ou medo
De sentir-me depois
Vindos dum palhaço no picadeiro

O fruto dos meus diplomas por sorte
E trabalho de tantos anos
Mal ou bem
Vem dando pra pagar as contas
Ter meu teto razoável
Alguns trajes elegantes
Até um Fusca setenta e quatro
E de vez em quando
Viajo pra Região dos Lagos
Pego praia
Tomo cerveja que levo
Em caixa de isopor
E degusto porções de camarão
Vendidas por ambulantes

Se estou em minha cidade
Nos sábados ensolarados queimo carne e me embriago
Nos domingos acompanho meu time na TV
Entretanto, nas finais, sempre vou aos estádios uniformizado

Vez ou outra após o trabalho
Faço um happy hour nos bares
Bebendo Whisky paraguaio
Fumando muitos cigarros
Daqueles baratos
Jogando conversa fora

Quando saio nas noites
Quase sempre é um pileque
E de repente me vejo na pista de dança dalguma boate
Desinibido e eufórico
Agitando-me dum lado pro outro
Em passes sincronizados
O estilo de música que mais odeio:

Funk!

Mas no dia a dia
No emprego
O porre é bem maior
- Ainda sem ter bebido gota alguma etílica -
Porque o trabalho me dá dinheiro
Um salário mínimo e meio!
E muitas dores de cabeça
Sem contar os sapos que engulo
E ter que acordar cedo
Com o despertador tocando
Mas nunca me realiza
E sempre quando me encaro no espelho
Entendo que essa não é a vida
Que pedi a Deus
No desencanto do meu olhar aborrecido
Como quem faz tudo por obrigação
Carregando um pesado fardo
À base de chibatadas no lombo
Conduzido a lugar nenhum

Vida besta!
Trabalho feito burro de carga
E ainda ontem paguei a conta d`água atrasada
Pendurei a do boteco da esquina
Faltou dinheiro mês passado
O crediário nas Casas Bahia
Paguei com dinheiro emprestado
Mas mês que vem entra o décimo terceiro
Pagando toda dívida, talvez sobre algum trocado
E eu gaste contente em compras no shopping
Na banca de queima de estoque
Sem extrapolar de novo o limite da minha conta
E me enforcar nos juros do especial tão alto

Minha namorada perdeu o emprego
Só vive reclamando da vida
E se descabelando de ciúmes de mim
Que ando tão na linha
Sempre estressada por nada
Resmungando que anticoncepcional engorda
E me cobrando noite e dia
Querendo receber
Muito mais que me dá

Falando nisso...
Só transamos duas vezes por semana!

Essa não é a vida que queria!
Que sonhei tanto quando criança
Mas não tenho coragem de me matar
Vou levando desse jeito
Que um dia
Naturalmente
Eu morro
E tudo acaba



Rob Azevedo





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